Me falaram que ser mãe não seria tarefa fácil: noites acordada, pouca privacidade, uma infinidade de perguntas, contas e mais contas… Bem ou mal me preparei para tudo isso e mesmo assim fui pega de calças curtas.
Ia dizer que ninguém me avisou que eu precisaria lidar também com meus monstros internos… Mas isso não é verdade. Há muito tempo em uma sensão de terapia Dornelis Benato, maravilhoso jungiano que me ajudou a mudar a minha perspectiva sobre a vida, me disse:
– Nossos filhos herdam nossos defeitos. Depois de questionado, ele me explicou que a frase não tem nada de mítica ou profética, simplesmente quer dizer que não podemos ensinar aquilo que não aprendemos. Estou me deparando agora mesmo com essa difícil verdade.
Minha filha Lia e eu de vez enquando temos alguns “arranca-rabo”. Ela é geniosa e eu… bem, eu sou uma pessoinha difícil de viver muito de perto. Outro dia ela desobedeceu algum pedido (ou seria uma ordem?) e acabou indo pro castigo. Ela ficou tão possessa que despejou em mim todos os insultos que conhecia. Gritou a plenos pulmões palavras como “ingrata”. Aiiiii! Eu fiquei furiosa!
Na hora de sair do castigo ela pediu desculpas e (igualzinha ao pai), já esqueceu, já superou, voltou a me amar e tudo ficou bem… pra ela, porque eu continuei enfurecida, passei o dia todo assim: toda séria, monossilábica e magoada.
Repassava na minha mente todas as coisas que eu poderia dizer ou fazer para ela se sentir do mesmo jeito que eu estava me sentido, e já que nenhuma delas era muito maternal me mantive fiel ao protocolo de mãe: põe de castigo, explica o porque, falando diretamente para ela, na altura dela, deixa 4 minutos ( 1 minuto por ano da criança) e na hora de tirar do castigo diz: você ficou de castigo por isso e aquilo e agora quero que você me peças desculpas. Desculpas pedidas, desculpas aceitas. Eu te amo, eu te amo e pronto.
Mas a verdade é que passei o dia dividida entre desejos de vingança e um esforço sobrehumano de fazer o papel de mãe-moderna-politicamente-correta.
Estava nesse clima quando ela (se arriscando muito!) perguntou:
-mamãe, porque você olhou pra mim assim?
eu, totalmente sonsa: – assim como?
Ela, imitando meu jeito de olhar: assim ó.
Eu: é que ainda estou chateada.
Ela: Por que?
Eu: Pelo que aconteceu hoje de manhã.
Ela: Ainda??!!!
Lia ainda não sabe disso, mas aprendo muito com ela, todos os dias uma coisa nova. Hoje foi o meu dia de aprender que preciso aprender a perdoar. Preciso aprender isso rápido. Tenho coisas a perdoar na vida, coisas velhas, guardadas num baú escondido bem no fundo do coração. Pensei que tinha que começar por ai, e me acovardei diante desse tarbalho de Hércules.
Felizmente essa perguntinha da Lia me trouxe a luz que eu precisava: começa agora mesmo, começa pelo que está vivo neste momento. Achei que ia ser muito difícil… mas surpreendentemente assim que parei de pensar na raiva que estava sentindo e no que a Lia fez, e passei a focar em como perdoá-la, o perdão foi nascendo dentro de mim.
No final do dia (o segundo dia), me senti tão feliz, tão leve, tão grata que acabei organizando a festa de princesa que ela tinha pedido. Na verdade era só um chá com bolo de banana + muito carinho.
Fala-se muito na importância de perdoar. Estou descobrindo que essa é uma habilidade essencial para criar uma criança: é preciso saber perdoar a si mesmo e ao outro. Estou longe de ter as respostas de como fazer isso sem sofrer e adoraria conhecer histórias e dicas de quem já passou por isso. Alguém se habilita?